terça-feira, 28 de julho de 2015

ELA BATEU EM RETIRADA - REVISTA VEJA


Advogada de metade dos delatores da Lava-Jato, Beatriz Catta Preta abandona clientes e deixa subitamente o país — ao menos um amigo diz que ela recebeu ameaças
REPORTAGEM: Mariana Barros e Laryssa Borges 

Mudar-se para Miami sempre esteve nos planos da advogada Beatriz Catta Preta. Há um ano ela abriu um escritório de consultoria na cidade americana, para onde viaja frequentemente com o marido e o casal de filhos — queria, inclusive, que o menino frequentasse uma escola bilíngue em São Paulo para se preparar para a mudança. Mas a ideia era ir para lá em "dois ou três anos", como chegou a dizer a um conhecido, e não bater em retirada como ela fez na semana passada. Há duas semanas, a advogada que negociou a delação premiada de nove dos dezoito réus confessos da Lava-Jato fechou o seu escritório em São Paulo, dispensou recepcionista e secretárias e parou de atender o celular. Na segunda-feira 20, enviou um e-mail a todos os seus clientes anunciando que não mais faria a defesa deles, Ato contínuo, deixou o Brasil.

Nada indicava que isso ocorreria. Catta Preta, como é conhecida, estava com a carteira de clientes abarrotada. Mesmo aos mais antigos, não tinha dado nenhuma pista de que pretendia mudar de país. "Só soube quando recebi o e-mail, nem imaginava", disse o operador financeiro Lúcio Bolonha Funaro, que está com ela desde 2003. Algo de muito grave fez com que Catta Preta decidisse sair de cena — e há indícios de que ela estava apavorada quando o fez. Em maio, por razões desconhecidas, deixou de mandar o filho à escola e pediu à direção o trancamento da matrícula. Em junho, foi a vez de tirar também a menina mais nova da escolinha que frequentava. Um advogado próximo de Catta Preta afirmou a VEJA que ouviu de um amigo comum aos dois que ela vinha recebendo ameaças e que, por isso, teria saído "fugida" do país.

No último dia 9 de julho, a advogada havia recebido uma ordem de convocação para depor na CPI da Petrobras com o objetivo de "explicar a origem dos recursos dos pagamentos de seus clientes". O requerimento de convocação foi assinado pelo deputado Celso Pansera, integrante do PMDB fluminense e acusado pelo doleiro Alberto Youssef de tê-lo ameaçado por ordem do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, de quem seria "pau-mandado".

Uma semana depois da convocação de Catta Preta, um de seus clientes, o ex-executivo da Toyo Setal Julio Camargo, afirmou em depoimento ao juiz Sergio Moro que Cunha tinha pedido 5 milhões de dólares de propina. Camargo não havia citado o nome de Cunha em seu depoimento anterior. A coincidência das datas suscitou especulações de que a convocação da advogada à CPI pudesse ser uma retaliação de Cunha pela inclusão de seu nome — que, ele já saberia, estava por vir — no depoimento de Camargo. O ex-diretor da Toyo Setal também foi convocado à CPI pelo mesmo deputado Pansera.

A súbita decisão de Catta Preta de abandonar seus clientes, a Lava-Jato e o Brasil adicionou mais um toque de mistério a uma carreira construída à margem do território habitado pelos grandes criminalistas brasileiros. Descrita por colegas como reservada e de poucas palavras, ela se formou na Unip e fundou a própria banca em 2002, quando deixou o escritório do ex-procurador da República e desembargador federal Pedro Rotta, morto em 2011. Foi ele quem lhe abriu as portas para o mundo de clientes endinheirados: doleiros, empresários e banqueiros. Em 2006, já em carreira-solo, ela fechou seu primeiro caso de delação de grande repercussão. Os clientes eram dois doleiros pegos na Operação Farol da Colina, da Polícia Federal, os sócios Richard A. de Mol Van Otterloo e Raul Henrique Srour. Desde então, firmou outros acordos importantes, mas o estrelato veio no ano passado, quando negociou a primeira de todas as delações premiadas da Lava-Jato, e até então a mais bombástica de todas, a do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa. Em outubro, quando ele foi para casa de tornozeleira eletrônica, ela deixou o caso.

Na ascensão da advogada, um personagem desempenhou papel fundamental: Carlos Eduardo Catta Preta Júnior, o marido, de quem herdou o sobrenome, é que trata das negociações com os clientes, estabelece o valor dos honorários e cuida das cobranças do escritório. Amigos dizem que ele tem grande influência sobre a mulher. Embora se declare oficialmente comerciante, Carlos Eduardo é conhecido como "doutor Carlos". O casal se conheceu em 2001, quando ele foi preso em Alphaville, na Grande São Paulo, com 50 000 dólares em notas falsas presas na cintura, dentro de um saco plástico. Em sua casa, agentes do Denarc, o departamento de combate ao tráfico de drogas, encontraram mais 350000 dólares falsos guardados no banheiro. Aos policiais, Carlos Eduardo contou que estava tentando vender as notas para se livrar do prejuízo que havia tomado ao vender a um indiano 17 quilos de esmeraldas retiradas de uma mina de pedras preciosas que arrendara na Bahia. Um amigo indicou-lhe o escritório de Pedro Rotta, onde trabalhava Beatriz Lessa da Fonseca, este o nome de solteira de Catta Preta. Ela o defendeu, conseguiu que respondesse ao processo em liberdade e tornou-se sua namorada. Em 2003, Carlos Eduardo foi condenado a três anos de prestação de serviços comunitários por crime de moeda falsa. Os dois se casaram, tiveram dois filhos e passaram a viajar com frequência para Miami. De acordo com amigos, é lá que estão agora. Sem previsão de retorno. O que teme Catta Preta?

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