domingo, 23 de agosto de 2015

Elio Gaspari - A blindagem de Eduardo Cunha


- O Globo

Fernando Henrique Cardoso disse o seguinte: “Se a própria presidente não for capaz do gesto de grandeza (renúncia ou a voz franca de que errou e sabe apontar os caminhos da recuperação nacional), assistiremos à desarticulação crescente do governo e do Congresso, a golpes de Lava-Jato”.

Poderia ter dito a mesma coisa a respeito de Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, denunciado pelo procurador-geral da República junto ao Supremo Tribunal Federal. Não disse. Nem FHC, nem qualquer outro grão-tucano.

Até agora, Dilma é acusada no Tribunal de Contas da União de ter pedalado as contas públicas. O TCU não é um tribunal, mas um conselho assessor da Câmara. Ademais, a acusação ainda não foi formalizada. Eduardo Cunha foi denunciado pelo Ministério Público por ter entrado numa propina de US$ 5 milhões. O PSDB quer tirar Dilma do Planalto e admite manter Eduardo Cunha na presidência da Câmara.

Surgiu em Brasília o fantasma de um “Acordão”. Nele, juntaram- se Dilma e Renan Calheiros. Há outro: ele junta Eduardo Cunha, o PSDB, DEM e PPS. Um destina-se a segurar Dilma. O outro, a derrubá-la. À primeira vista são conflitantes, mas têm uma área de interesse comum: nos dois Acordões há gente incomodada com a Lava-Jato. A proteção a Dilma embute a contenção da LavaJato, evitando que chegue ao Planalto ou a Lula. A proteção a Eduardo Cunha pretende conter a responsabilização dos políticos de todos os partidos metidos em roubalheiras.

É sempre bom lembrar que Fernando Collor, também denunciado por Janot, renunciou ao mandato em 1992, mas foi absolvido pelo Supremo Tribunal Federal. Renan Calheiros foi líder de seu governo no Congresso, e Eduardo Cunha dele recebeu a presidência da Telerj.

Deu-se a grande pedalada elétrica

O que parecia ser uma simples pedalada elétrica transformou-se numa competição de velódromo. O governo mandou ao Congresso a Medida Provisória 688, que tenta cobrir o rombo de pelo menos R$ 10 bilhões imposto às geradoras de energia, jogando-o nas contas de luz dos consumidores.

Em 2013, na sua fase triunfalista, a doutora Dilma baixou as tarifas de energia. Ela sabia que o sistema estava no osso, e algumas hidrelétricas já precisavam comprar energia térmica, mais cara. Veio 2014, faltaram chuvas, a situação agravouse, e as geradoras ficaram com um rombo. Conseguiram 22 liminares e já deixaram de pagar R$ 1,4 bilhão.

A MP 688 pretende contornar essa crise com uma pedalada. Para que as empresas desistam de seus litígios, oferece-lhes a velha e boa moeda da prorrogação de suas concessões por mais 15 anos. Junto com esse mimo, mudaram-se as regras do jogo para as relações do governo com as concessionárias. Admitindo-se que se fez o melhor possível, há um gato na tuba. É o paragrafo 8º do artigo 5º. Ele diz que tudo o que for combinado poderá ser rediscutido. Donde, tudo pode acontecer. Conhecendo-se os poucos raspões da Operação Lava-Jato no setor elétrico, esse dispositivo é no mínimo perigoso.

A MP 688 inclui um golpe típico da retórica do comissariado petista. Em 2004, jogando para a plateia, a doutora Dilma tirou dos novos contratos de concessões uma cláusula que obrigava as empresas a pagar pelo “uso do bem público”. Para fazer caixa, ela voltou, com o nome de “bonificação pela outorga”.

Reduzindo a questão à sua expressão mais simples: o governo baixou tarifas, fingiu que havia energia hidrelétrica disponível, obrigou as concessionárias a operar com as térmicas e produziu um rombo bilionário. Quem pagará? O distinto público.

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